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ENDO 2 - Emergências e urgências em Endodontia

  • anacrp
  • 5 de jul. de 2023
  • 8 min de leitura

Aula 4










Uma das mais importantes atribuições do cirurgião-dentista refere-se à remoção da dor do paciente. A dor de origem pulpar ou perirradicular corresponde a cerca de 90% dos casos de emergência, sendo a intervenção endodôntica necessária para o alívio dos sintomas. Uma emergência endodôntica pode ser definida como dor ou edema decorrente da inflamação e/ou infecção dos tecidos pulpares ou perirradiculares, requerendo diagnóstico e tratamento imediatos. A etiologia das emergências são uma combinação de irritantes (cáries, restaurações profundas ou defeituosas, e traumas graves, como luxação, avulsão ou fraturas), que induzem à inflamação aguda na polpa ou nos tecidos perirradiculares. Assim, o profissional deve possuir um adequado conhecimento das alterações que acometem esses tecidos, com o intuito de realizar um correto diagnóstico e tratamento das emergências em Endodontia.



Emergência Vs urgência

É importante diferenciar uma emergência verdadeira da menos crítica urgência, sejam elas um problema pré-tratamento, entre consultas ou pós-obturação. A emergência é uma condição que requer uma consulta não agendada para diagnóstico e tratamento devido à gravidade do problema. A urgência é um problema menos grave, em que a consulta pode ser agendada para conveniência mútua do paciente e dentista (devendo ser feita o mais breve possível, pois pode evoluir para uma emergência). As seguintes perguntas devem ser feitas ao paciente para o reconhecimento de uma emergência verdadeira:


- O problema perturba seu sono, alimentação, trabalho e/ou concentração? Uma emergência verdadeira rompe o equilíbrio do paciente e o impede de executar suas atividades rotineiras.

- Há quanto tempo este problema vem incomodando? Raramente uma emergência dura mais do que 2 dias.

- Fez uso de algum remédio para dor? Foi eficaz? Analgésicos não aliviam de forma eficaz a dor de uma emergência verdadeira.


Uma resposta positiva a uma destas perguntas constitui uma emergência verdadeira, requerendo atendimento imediato para o restabelecimento do conforto do paciente. O estado emocional e mental do paciente também deve ser avaliado, pois, para alguns deles, mesmo um problema de pouca gravidade toma grandes proporções e é perturbador.



Diagnóstico

O diagnóstico correto é fundamental para a resolução de uma emergência. Pacientes com dor frequentemente fornecem informações e respostas exageradas e imprecisas, acreditando que a dor severa emana de mais de um dente. No entanto, a regra geral de uma emergência verdadeira é a de que um dente é o causador da dor. Assim, para se chegar a um correto diagnóstico, uma abordagem sistemática do paciente deve ser realizada da seguinte forma: exame subjetivo (anamnese), exame objetivo e exames complementares (radiografias).



Emergências endodônticas verdadeiras

O papel das bactérias e seus subprodutos nas emergências endodônticas está bem estabelecido, sendo considerados os principais agentes causadores de condições patológicas dos tecidos pulpares e perirradiculares. A irritação desses tecidos resulta em inflamação. A dor oriunda da inflamação ocorre, principalmente, devido a liberação de mediadores químicos (causando dor pela ativação e diminuição do limiar de resposta de fibras nervosas, e pelo aumento da permeabilidade vascular com consequente edema) e a pressão (o edema resulta em aumento da pressão hidrostática tecidual e da compressão das fibras nervosas sensoriais, estimulando mecanicamente os receptores da dor). Assim, alterações pulpares e perirradiculares podem resultar em dor e/ou tumefação, levando o paciente a procurar um tratamento emergencial. A maioria das emergências verdadeiras requer uma abordagem ao sistema de canais radiculares (SCR), através da remoção do agente agressor e, consequentemente, da inflamação dos tecidos, resultando em alívio imediato da sintomatologia. A dor nas emergências endodônticas pode ser de origem pulpar ou perirradicular. Trincas e fraturas também estão relacionadas às emergências, sendo, muitas vezes, de difícil diagnóstico, apresentando dor súbita e aguda em casos de polpa vital.

Dor de origem pulpar

Pode ser resultado da estimulação de 2 tipos de fibras nervosas: fibras A-delta e do tipo C. As fibras mielínicas A-delta são responsáveis pela dor de origem dentinária. Uma vez exposta à cavidade oral, a dentina torna-se sensível a estímulos (doce ou frio), mesmo na ausência de um processo patológico (hipersensibilidade dentinária). Nos estágios iniciais da inflamação pulpar (pulpite reversível), o limiar de excitabilidade dessa fibra é reduzido, tornando-a mais suscetível a estímulos. A dor oriunda da estimulação das fibras A-delta é provocada, rápida e de curta duração, desaparecendo após a remoção do estímulo. Quando a dor é desta natureza, o problema é geralmente solucionado sem a necessidade do tratamento endodôntico. Enquanto a hipersensibilidade dentinária é tratada por agentes dessensibilizantes e/ou pela oclusão dos túbulos dentinários, a pulpite reversível é solucionada pela remoção do tecido cariado ou restauração defeituosa seguido da restauração do elemento dentário. Tanto a hipersensibilidade dentinária como a pulpite reversível são consideradas casos de urgência, e não emergências verdadeiras. Fibras amielínicas do tipo C são responsáveis pela dor severa, contínua, espontânea e excruciante. Nesses casos, há a necessidade de intervenção endodôntica para alívio da sintomatologia. Assim, a pulpite irreversível sintomática constitui-se na emergência verdadeira de origem pulpar.


- Pulpite irreversível sintomática: é uma condição clínica na qual a polpa vital inflamada é incapaz de retornar ao seu estado normal, mesmo após a remoção da agressão. A inflamação irreversível da polpa ocorre quando da sua exposição por cárie, com o paciente apresentando dor severa, contínua, excruciante e espontânea. Dependendo do estágio da inflamação, o uso de analgésicos pode não ser eficaz. O teste térmico do frio alivia a dor (vasoconstrição) enquanto o teste do calor exacerba a mesma (vasodilatação). Na maioria das vezes, os testes perirradiculares são negativos. O tratamento ideal consiste no completo preparo químico-mecânico do SCR. Caso não haja dor a percussão, indicando que a inflamação está restrita à polpa, realiza-se a obturação. Se por qualquer limitação (tempo, habilidade do operador, anatomia e/ou dor à percussão) houver necessidade de outra consulta, deve-se aplicar uma medicação intracanal à base de hidróxido de cálcio. Nos casos em que existe a limitação de tempo, realiza-se a pulpectomia e medicação intracanal com corticosteróide em dentes unirradiculares. Nos multirradiculares, realiza-se a pulpectomia parcial do canal mais amplo ou apenas a pulpotomia (quando o tempo for muito curto), seguido de medicação intracanal com corticosteróide. A prescrição de um leve analgésico/anti-inflamatório está indicada. Não há indicação de antibioticoterapia.


Dor de origem perirradicular

Está relacionada à inflamação dos tecidos perirradiculares, resultante da presença bacteriana no interior do SCR. As emergências verdadeiras de origem perirradicular são: necrose pulpar com periodontite apical sintomática (aguda), abscesso perirradicular agudo, flare-up e dor pós-obturação.


- Necrose pulpar com periodontite apical sintomática (aguda): é caracterizada por intensa dor à mastigação e ao toque, com o paciente relatando sensação de “dente crescido” devido ao edema no ligamento periodontal apical. O teste de percussão é sempre positivo, sendo bastante doloroso. O teste de palpação pode ou não ser positivo. Radiograficamente, pode haver ou não espessamento do espaço do ligamento periodontal. Se a presença bacteriana no SCR for a responsável pela inflamação perirradicular, o tratamento consiste no completo preparo químico-mecânico do SCR. Em seguida, coloca-se uma medicação intracanal à base de hidróxido de cálcio, selamento coronário, prescrição de analgésico/anti-inflamatório. Antibióticos não são indicados. Se houver qualquer tipo de limitação (técnica, tempo ou anatômica), deve-se realizar o preparo dos terços cervical e médio, colocação de uma mecha de algodão embebida em NaOCl na câmara pulpar, selamento coronário, prescrição de analgésico/anti-inflamatório e alívio da oclusão. Nesses casos, a completa instrumentação do SCR deve ser feita em até 7 dias.


- Abscesso perirradicular agudo: é caracterizado por dor espontânea, pulsátil e à mastigação. Os testes de percussão e palpação são positivos. Pode haver mobilidade dentária e envolvimento sistêmico com a presença de febre. O tratamento varia conforme o estágio de evolução do abscesso:


Inicial -> Ainda não há tumefação. Esses casos são frequentemente dolorosos, devido à pressão do exsudato purulento em um meio que não se expande. Muitas vezes, o diagnóstico é confundido com a periodontite apical sintomática, só sendo confirmado quando da drenagem de pus via canal. O tratamento consiste na abertura coronária, preparo inicial e drenagem da coleção purulenta pelo canal. Após a drenagem, realiza-se o tratamento de forma idêntica (preparo químico-mecânico completo) ao caso de necrose pulpar com periodontite apical sintomática, seguido de medicação intracanal a base de hidróxido de cálcio, selamento coronário e prescrição de analgésico/anti-inflamatório.


Em evolução -> É semelhante ao estágio inicial, mas com tumefação consistente, não flutuante. A dor é pronunciada quando o abscesso se localiza no espaço subsperiosteal, por causa da rica inervação do periósteo. Um dramático alívio da dor ocorre após a ruptura do periósteo pelo exsudato purulento. Idealmente, o tratamento consiste na incisão da mucosa em casos de tumefação intraoral, seguido de intervenção igual ao do estágio inicial. Essa incisão prévia reduz a pressão, responsável pela dor, e deixa o paciente mais confortável para os procedimentos de acesso e preparo do SCR. Se a tumefação for extraoral, é recomendado não incisar, prescrevendo a aplicação de calor intraoral (bochechos com solução aquecida) e frio externamente a área de tumefação. Isso visa a exteriorização intraoral do abscesso, facilitando a incisão e drenagem em consulta posterior. Se não houver drenagem via canal, pode-se realizar uma ampliação foraminal até uma lima #25 para estimular a mesma. Analgésicos/anti-inflamatório devem ser prescritos.


Evoluído -> É um quadro clínico semelhante aos anteriores, mas com tumefação flutuante. O tratamento consiste na incisão da área flutuante (intra ou extraoral) e na drenagem de pus via canal. O completo preparo químico-mecânico do SCR deve ser realizado seguido de medicação intracanal à base de hidróxido de cálcio e selamento coronário. Se houver drenagem extraoral, coloca-se um dreno. A prescrição de bochechos com solução aquecida e de analgésicos/anti-inflamatórios está indicada.

Deixar o dente aberto (sem restauração coronária) para drenagem do exsudato após a limpeza e modelagem do SCR apenas traz problemas pois permite um aumento significativo da população microbiana dentro do canal, introduz substrato para a proliferação microbiana e aumenta o risco de exacerbações. Essa situação só é justificada quando não há tempo ou material disponível para o tratamento ou quando a drenagem de pus não cessa no tempo esperado, o que é muito raro. A drenagem do exsudato purulento ocorrerá por áreas de menor resistência. Entretanto, a drenagem do pus para determinados espaços fasciais são potencialmente perigosos e com risco de vida, como nos quadros de angina de Ludwig e trombose do seio cavernoso. O paciente deve ser acompanhado cuidadosamente até a remissão dos sintomas. O uso indiscriminado, abusivo e empírico de antibióticos é considerado uma conduta inaceitável nos dias atuais, sendo seu indicado em casos de abscesso somente quando houver o desenvolvimento de edema generalizado e difuso (celulite), envolvimento sistêmico com febre, mal-estar e linfadenite regional, e quando o abscesso ocorrer em pacientes debilitados e/ou com risco de desenvolver endocardite bacteriana.


- Flare-up: é uma emergência que se desenvolve entre as sessões do tratamento endodôntico, sendo caracterizada por dor e/ou tumefação. É decorrente de uma resposta inflamatória aguda nos tecidos perirradiculares, caracterizada pelo desenvolvimento de uma periodontite apical sintomática (aguda) ou de um abscesso perirradicular agudo, causado por microrganismos ou por iatrogenia durante o preparo do SCR, como sub e sobreinstrumentação, extravasamento de NaOCl, extrusão de debris e perfurações. Quando o mesmo é caracterizado como uma periodontite apical aguda secundária, o tratamento consiste na remoção do selamento coronário, revisão do preparo químico-mecânico, seguido de medicação intracanal à base de hidróxido de cálcio e novo selamento coronário. Se o flare-up é caracterizado como um abscesso perirradicular agudo secundário (abscesso fênix), considera-se que o abscesso já está instalado, devendo ser tratado como um abscesso primário. A prescrição de analgésicos/anti-inflamatórios é indicada em ambos os casos. O uso de antibióticos está indicado somente quando houver as condições citadas anteriormente.


- Dor pós-obturação: são infrequentes, embora a dor leve seja comum. Sua etiologia não é bem esclarecida, porém está associada ao extravasamento de material obturador e a presença de dor pré-operatória. Uma intervenção ativa geralmente não é necessária, com os sintomas se resolvendo de forma espontânea. Entretanto, se a dor for aguda e persistente, o tratamento dependerá da situação: (i) obturação adequada - prescrição de analgésico/anti-inflamatório; (ii) Obturação inadequada - o retratamento está indicado; e (iii) sobreobturação - prescrição de analgésico/anti-inflamatório e proservação. Caso a sintomatologia não se resolva, deve-se remover o selamento coronário, realizar a drenagem e retratamento. Se mesmo assim o problema não for resolvido, a cirurgia perirradicular é indicada para curetagem do material extravasado. A cirurgia também é indicada quando a obturação for incorrigível.




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